“Alô!”
“Ahã”
“Filho,
sou eu. Quero saber se o nosso compromisso de sábado à tarde está de pé, as
14.00 lembra? Para fazer a sua inscrição no curso.”
“Belê!
Tchau!”
Essa é a transcrição de um diálogo entre um Pai e
seu filho adolescente. Creio que está na íntegra, se errei foi por excesso.
Revela tanto a criatividade humana para inventar expressões e se comunicar
inteligentemente, como, por outro lado, a consequência inexorável da economia
de palavras a qual estamos fadados. Minha opinião aqui não é crítica, ou
melhor, se for, é autocrítica. Que direito tenho eu de condenar os adolescentes
por usarem gírias e neologismos? Eu também tive os meus, que com o passar do
tempo se tornaram “paia” e agora são “bregas” sem nenhuma chance de se tornarem
“top”. Haverá um dia, e não muito depois desse, que as muitas expressões que
pululam o nosso linguajar cotidiano serão inutilizadas pela necessidade dos
jovens e adolescentes de falarem um idioma desconhecido dos adultos.
“Ahã”, “belê” e “tchau”
resumem um discurso, um diálogo, e são por incrível que pareça quase sempre
suficientes, mas veja bem, eu disse quase sempre. E é sobre esse quase que
gostaria de discorrer aqui. Pouco antes de sua morte José Saramago fez um
comentário sobre a brevidade dos diálogos no Twitter, em suas palavras:
"Os
tais 140 caracteres refletem algo que já conhecíamos: a tendência para o
monossílabo como forma de comunicação. De degrau em degrau, vamos descendo até
o grunhido"
Pode parecer extremo ou amargo, mas a preocupação de Saramago procede.
Pensando sobre suas palavras e a evolução crescente do Facebook, primo mais
moderno e eficiente do Twitter. Considero o seguinte:
1)
Que a nossa
redução de palavras em uma conversação, seja por questão de tempo ou por
economia de raciocínio, não ocorre sem ônus. Indico apenas dois desses casos.
Faço assim por economia de tempo ou de raciocínio mesmo (não o meu, mas dos
leitores nesse texto que já vai ficando longo). Por um lado, aumentamos o campo
semântico das palavras, diminuindo sensivelmente as diferenças de nuance das
expressões e termos. Por exemplo, o que significa “curtir” no face? Gostei?
achei legal? Bonito? Engraçado? Concordo? ou foi só curiosidade? Há pouco tempo
ainda ouvia algumas pessoas usarem a expressão “está curtindo com a minha
cara”, ou seja pode ser que alguém ao curtir o que escrevi ou uma foto minha
esteja zombando de mim (o que seria uma tradução razoável para “curtir no
face”). Em resumo, à medida que aumentamos os significados dessas palavras,
mesmo que elas sejam tomadas como gírias, eu perco os seus específicos sentidos.
O pior é que as expressões diminutas do nosso
restrito vocabulário facebookiano,
vêm desacompanhadas de contexto. Ou em frases tão curtas que um único particípio
se torna o seu sujeito, verbo e predicado. Há poucos dias acompanhei alguém que
postava: “comendo”, “dormindo”, e só. O que ele quis dizer fica por conta da
minha imaginação. Sofremos no vernáculo o que já nos foi diversas vezes
alertado quanto às nossas interpretações, especialmente as bíblicas. Quanto
menos contextos maiores as deduções. Não sei porque, nem como, nem onde, nem
quando, ou de quem e para quem, sei menos ainda para que. E sob tais condições
deduzo, que meu amigo dorme o sono dos justos, ou se esqueceu de mudar seu
post, deixando todo mundo com a ideia de que Morfeu lhe faz companhia. Imagino
o universo de deduções que compõe a atmosfera do planeta Facebook nesse exato
momento, e somente para não perder a oportunidade, cito novamente Saramago, em
uma entrevista, em resposta à pergunta sobre a diferença entre escrever um
livro e fazer o mesmo no seu blog (isso para dar o contexto): “Nenhuma. Continuo a utilizar frases longas,
das que dão espaço e tempo para observações e análises que considero
necessárias. A tão louvada clareza das sínteses é, não raro, enganosa”. Isso
explica a multiplicação de enganos frutos da rede, contudo colhidos na vida
pessoal.
2)
Além do mais
me preocupam algumas expressões não muito adequadas que encontramos na rede
social. Confesso, com medo de ofender algumas pessoas a quem quero tão bem, que
não tenho e não sou “amigo” de 1.000 pessoas. Primeiro que isso é humanamente
impossível, segundo porque, a expressão “amigo” tornou-se um genérico de
múltiplas relações humanas, mas especialmente porque com nossa tendência à
ilusão findamos acreditando que realmente todos eles são nossos “amigos”, e que
“curtem” os nossos “posts”. Luto para continuar acreditando que amigos são
aqueles que tomam café na sua cozinha e riem da vida ao seu lado, e choram suas
dores também. Aqueles que dizem, às vezes, a verdade que dói, mas que cura,
porque foi dita somente a você.
3)
Isso me leva
a terceira e última conclusão. Acompanho no Face a campanha para colher
assinaturas contra o Big Brother Brasil, prevejo que absolutamente nada irá
acontecer. Penso assim porque creio que uma boa parte daqueles que assinarão o
protesto irão dar uma “espiadinha na casa”. O que tira um programa do ar é a
perda de audiência. Entretanto, os reality shows já estão encarnados em nossa
cultura. Seja nas telinhas da TV, do computador ou mesmo dos celulares.
Programas como Facebook ou Instagram me dizem o onde estão e o que as pessoas
estão fazendo em tempo real. A vida se tornou um imenso reality show.
Por fim, você deve estar se perguntando ou quem
sabe já deduzindo porque eu continuo no facebook. Quando me venderam a ideia,
me disseram que era um poderoso meio de comunicação que além de eficiente era
extremamente barato. Acredito que seja sim. E que por isso ele é essencial para
a vida profissional. Foi por essa única e específica razão que entrei no
facebook e me mantive lá até agora. Enfim, espero que meu texto não seja vítima
de algum mal entendido ou fruto de especulações acerca da minha real motivação
ao escrevê-lo, cito com a indevida liberdade literária a frase atribuída a
Jânio Quadros, inclusive com a sua imprecisão, “Fi-lo, porque qui-lo. Lê-lo-á quem suportá-lo!”. Fica aqui o pedido de desculpas antecipadas
àqueles que porventura vierem a se ofender e o convite aos amigos para um café
na mesa de minha cozinha.
Até breve! BELÊ?
2 comentários:
" Curti" estas considerações ! Aristóteles afirma que o homem é um animal político, sustenta sua tese no pressuposto que " o homem é o único que possui linguagem, enquanto os animais apenas expressam dor ou prazer através de sons" ... será que estamos caminhando neste sentido ?
"Curti " estas considerações mestre. A linguagem é própria dos seres humanos. Aristóteles diz que " o homem é um animal politico, e sustenta sua tese no pressuposto que o homem é o único que possui linguagem, enquanto os animais apenas expressam dor ou prazer através de sons. Faz pensar ...
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