Lucas 18 e 19 (2)
Voltando à pergunta original, o que uma criança, um cego e um publicano têm em comum? A resposta ainda é a mesma, o reino de Deus. Como vimos no texto anterior Lucas, em seu evangelho (capts. 18 e 19) contrasta esse grupo de pessoas desprezadas pelo farisaísmo, identificado no seu ideal, um homem cumpridor e muito abençoado, entenda-se muito rico. Nessa segunda parte devemos olhar para esses indivíduos e buscar neles o que os faz aptos para o reino. E a resposta a essa questão não pode ser outra senão a fé. Embora, alguns possam objetar que a palavra fé não ocorra na passagem estudada, podemos com cuidado observar que embora ausente a evidência dela está presente. Senão vejamos.
A criança
Em primeiro lugar, devemos reafirmar que a criança não entra no reino por ser criança. A infância não é sinônima de inocência, na melhor das hipóteses seria de ingenuidade, mas não de inocência. O simples fato de ser uma criança não a torna salva, e, portanto o objetivo de Jesus não era entendêssemos a salvação ou o reino sob esse prisma. Em segundo lugar, a frase “receber o reino como uma criança...” não significa mera credulidade. Alguns interpretam que devêssemos ser como crianças, que crêem com facilidade e de nada duvidam. Baseados em suas experiências pessoais ou conhecimentos empíricos concluem que as crianças são exemplos de credulidade. Outra inverdade, porque somos salvos através da fé e não por causa dela. Em outras palavras, a fé não é autora de nossa participação no reino de Deus e sim seu meio, desde que depositada no objeto correto, ou seja, Em Jesus Cristo.
Então como compreender o dito de Jesus? Pelo contexto, ou seja, na concepção judaica partilhada pelos discípulos. Para eles as crianças são incapazes de compreender a lei, excluídas dos debates e marginalizadas das discussões. Portanto, conduzidas pelos seus pais e responsáveis à prática da lei. Pois essa é a grande evidência da fé, o reconhecimento de incapacidade, os se preferirem a confiança em Cristo e não na capacidade intelectual. As crianças eram preteridas por não serem capazes de compreender a lei, sua aptidão ocorria apenas após o Bar Mitzva. A partir de então essa pessoa (não mais uma criança) estaria apta para a lei. Observe no diálogo com Jesus a resposta daquele que era reputado como modelo de espiritualidade.
Sabes os mandamentos... (Jesus)
Tudo isso tenho observado desde a minha juventude... (rico)
Dede de a juventude, não da infância. A questão é onde a fé está depositada ou se preferirem, em quem eu confio. Em mim? Em minhas capacidades de compreender doutrinas e teologias? Na capacidade humana de mergulhar nas profundezas ocultas de textos bíblicos? Ou em Jesus Cristo? Receber como uma criança é fazê-lo na plena e total dependência de Deus e não em minhas capacidades humanas. Portanto, como evidência da fé, nos tornamos como uma criança e depomos nossas capacidades e confiamos unicamente em Jesus.
O cego
E quanto ao cego? No caso dele a fé parece mais evidente. Seu clamor e desespero, sua cura e salvação não deixam duvidas, houve fé. No entanto, não permita que o óbvio te impeça de ver o propósito da passagem. Considere, em primeiro lugar, que o rico foi embora porque não quis deixar suas riquezas para seguir a Jesus (vem e segue-me... 18.22). No raciocínio da sua religiosidade incrédula o homem rico não estava diante da opção entre Deus e a riqueza, mas entre Jesus, um mestre e a riqueza. Considere que os discípulos representados por Pedro, também esperam retribuição terrena por terem seguido a Jesus (18.28). Por fim, considere a predição que Jesus faz de sua morte e humilhação (18.31-34), ele descreve claramente as injurias e cusparadas. Portanto, antes de introduzir a narrativa do cego de Jericó, Lucas observa sobre os discípulo:
“Nada compreenderam...” (18.34)
Se você ainda não percebeu aonde Lucas nos conduz, pode-se dizer de outra forma. Ironicamente, o cego viu o que nem o rico homem abençoado e nem os discípulos viram. Ali estava o Filho de Davi, o Rei, a profecia se cumpriu.
O cego provavelmente não havia saído de Jericó, não havia visto sinais, nem presenciado milagres, não contemplara o mar sendo acalmado e nem os pães sendo multiplicados, jamais observara enfermos sendo curados e nem tão pouco ouvira um discurso de Jesus. Provavelmente ouvira apenas sua fama por meio de terceiros e por meio de comentários sobre Jesus. Mas, ao saber que ali estava Jesus, creu. Viu, ainda que cego, o que poucos viram, o Rei (cf. 19.27). Além do que é digno de nota a diferença entre o cego e os discípulos. Enquanto o cego clama por misericórdia ao Rei, os discípulos pedem retribuição pelos seus esforços e sacrifícios. Não podiam ser mais evangelicamente contemporâneo. As igrejas evangélicas hoje buscam mais a retribuição que a misericórdia.
O Publicano
Por fim, resta-nos o publicano Zaqueu, o coletor de impostos. Em primeiro lugar, peço perdão pela licença literária de tentar atualizar a figura de Zaqueu através de um funcionário público. Sem demérito para o funcionário público e sem generalizações a intenção era chamar atenção para a figura. Em segundo lugar, não devemos compreender Zaqueu à luz da música de Regis Danese que faz de Zaqueu um crente antes mesmo de subir na árvore. A ênfase não está em Zaqueu, mas em Jesus e sua livre deliberação de entrar e comer na casa de um pecador. E é aí que encontramos a evidência da fé. Na relação existente entre o reconhecimento do pecado e o arrependimento. Zaqueu nada mais era do que um dos piores tipos de pecadores aos olhos dos judeus, especialmente os fariseus. Mas somente pecadores se arrependem. Aos seus próprios olhos o rico era justo e cumpridor estrito da lei, não era um pecador. Era um justo como o fariseu da parábola do fariseu e publicano (18.9-14). Os discípulos chegaram à conclusão que se aquele protótipo de habitante do reino não herdaria a vida eterna e se dificilmente um rico entra nesse reino, então é impossível para eles entrarem. Boa teologia! Realmente é impossível ao homem entrar, ninguém pode fazê-lo. Nem o entendimento da lei, nem o frustrado esforço em cumpri-la, e nem mesmo o sacrifício a seu favor, nada é suficiente para entrar no reino, por isso para o homem é impossível. Somente Deus pode , porque para ele não há impossíveis (Lc.1.37).
Zaqueu, o pecador, foi salvo por Jesus mediante a fé. Evidências da fé? Arrependimento. Sem entrar nos detalhes do cumprimento da lei quanto à indenização e fraudes, apenas observe que Zaqueu não deixou de ser publicano.
Conclusão
Precisamos aplicar essas conclusões à nossa vida, porque ler a Bíblia e não aplicá-la é como mastigar sem ingerir, tem se o prazer do sabor, mas não alimenta. Lembre-se, não se considere cidadão do reino porque faz parte de uma denominação ou porque tem uma religião. Nem se considere apto para o reino porque é capaz de compreender a intrincada teologia dos cristãos, ou porque faz grandes esforços por praticar suas doutrinas ou mesmo os sacrifícios em favor da igreja. Lembre-se mais, não meça sua participação no reino pelas bênçãos da graça comum, como se saúde e dinheiro fossem vistos no seu passaporte do reino. Só uma pessoa é capaz de introduzi-lo no reino, e Jesus o fará por meio da sua fé.
Por fé entenda as evidências que ela traz à sua vida. Reconheça sua incapacidade de compreender essa graça e diante de sua capacidade dependa inteiramente de Deus. Reconheça a Jesus como o rei, e crendo nele clame por misericórdia, não por retribuição. Reconheça que és tão pecador quanto o maior pecador que você conhece e então se arrependa como Zaqueu ou como o publicano da parábola, e diga humilde e sinceramente: “Ó Deus, Sê propício a mim, pecador!”
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